Mãos

são só duas mãos

pra tentar segurar o mundo

mesmo juntas, em concha

as mãos

são só duas

e elas cansam

e elas separam

e elas deixam vazar

e nos lembram

que não se pode ter tudo

nem por um segundo

Excessos

nada mais cabe

em meus excessos

eu mesma

quando me sobro

transbordo

Liberdade

nasci num estado de liberdade

meu caos

organizo por cor

meus medos

pesam tanto quanto um pássaro

e só me prendo

se puder estar solta no vento

Desconstrução

desromantizei o tempo

não é verdade

que os anos

nos amansam

aceite ou não

o tempo é bruto

- ele -

nos endurece

às vezes me falta

alma

ou coração

mas nunca me falta

punho

nem peito

Chuvisco

a timidez do chuvisco

impediu ele

de se tornar

tempestade

Entrega

vago

pela noite

varo

a madrugada

me viro

do avesso

me entrego

em vísceras

sem você

nem perceber

é preciso

observar meus silêncios

Sirene

ouço a sirene

o toque de recolher

começou

e eu não

obedeço

nunca senti

tanta vontade

de partir

Perseguição

não há tempo

para calçar os sapatos

é preciso sair correndo

em disparada

antes que a vida

vire a esquina

e a gente a perca

de vista

Essencial

desapego

de quase tudo

em tempos de muito

vou na contramão

necessário mesmo

só os braços

em arco

Leveza

logo

tudo isso é passado

e estaremos rindo 

dos nossos tropeços

a graça do presente

é essa

faz ser cômico

até as maiores tragédias

de amor