Ela não saía daquela janela. Pelo menos não nos momentos em que eu passava
de manhã pela rua, sempre na calçada correspondente à minha direita, procurando
um pouco de sombra. Não que a direita fosse algum tipo de obsessão ou toc. Nem
a sombra era uma obsessão ou toc. Digamos que era um hábito, criado assim, do
nada. Talvez tão do nada quanto o hábito da mulher de ficar na janela. Quando
será que ela começou a fazer isso? Será que tinha visto uma coisa muito
interessante um dia e esperava ver novamente? Será que tinha visto alguém especial?
Será que gostava de cachorros e ficava ali esperando os donos levarem – e serem
levados – pelos seus bichos para passear? Ou seria um hábito desinteressado
mesmo, que aconteceu do nada. Simplesmente ir para a janela e ali ficar. Não
sei. Poderia ser uma obsessão também, um toc. Mas por janela? Nunca ouvi falar
de alguém obcecado por janela. Enfim. O fato é que todo dia eu passava por ali,
cedinho, do lado direito da calçada, fugindo do sol, e ela estava lá, olhando
para tudo e para nada ao mesmo tempo. Como um mantra. Ela na janela, eu passando
pela sombra, do lado direito da calçada. Ela na janela, eu passando pela
sombra, do lado direito da calçada.
Hoje, atipicamente, o dia amanheceu sem sol. Passei pelo lado direito
da calçada, desta vez tomada inteira pela sombra. Procurei a mulher na janela.
Ela não estava.
Ou não estava porque o sol não veio, ou o sol não veio porque ela não
estaria mais lá.
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